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Sexta-feira, 29 de março de 2024
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José Osmar

joseosmaralves@hotmail.com

23/02/2017 - 14h50

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José Osmar

joseosmaralves@hotmail.com

23/02/2017 - 14h50

Nada há de errado com a nomeação de Alexandre de Moraes

Toda a celeuma em torno da indicação de Alexandre de Moraes para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal é conversa fiada de quem não conhece ou não quer reconhecer a natureza institucional daquele colegiado.

 

A Constituição Federal, no entanto, é muito clara: o Supremo Tribunal Federal é composto por onze Ministros, brasileiros natos (art. 12, § 3º, IV), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101), escolhidos e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único). É isso. E ponto final.

 

Evidentemente, qualquer cidadão que ostente essas condições pode ser nomeado ministro do STF, não necessitando sequer que seja bacharel em Direito, pois, neste quesito, a Constituição só exige notável saber jurídico.

 

Cândido Barata Ribeiro, médico baiano, foi ministro do Supremo por dez meses, do final de 1893 a setembro de 1894. Indicado por Floriano Peixoto, Barata Ribeiro assumiu a cadeira de ministro e somente dez meses depois foi sabatinado pelo Senado Federal (naquele tempo a sabatina podia ser depois da posse). Como Floriano não tinha maioria na Casa, seu ministro foi recusado e teve que se afastar do cargo. O motivo alegado pelos senadores foi que Barata Ribeiro não comprovara notável saber jurídico, mas a verdade é que a decisão foi uma represália a Floriano Peixoto. Essa história pode ser vista com mais detalhes num artigo do min. Celso de Mello (“Notas sobre o Supremo Tribunal”), publicado no site do Supremo Tribunal Federal.

 

Mas voltando aos nossos dias, suspeito que Michel Temer não poderia ter feito indicação mais acertada, do ponto de vista do grupamento político que ocupa hoje o poder nacional. É isso aí mesmo. Saber jurídico, Alexandre tem. Reputação ilibada?

 

Bom, combinemos que reputação é – porque é justamente o que é - um conceito-reflexo da cultura de um povo, e que cultura seja o conjunto de agires e costumes aceitos desse mesmo povo, e, ainda, que a cultura prevalente seja - como sempre é - os agires e costumes das elites.

 

Assim, a única conclusão lógica a que se pode chegar – para o caso da indicação de Temer – é que a reputação de Alexandre de Morais (segundo os agires e costumes chancelados pelo seu grupo) o credencia a assumir galhardamente a cadeira de Teori.

 

O presidente da república deve fazer a indicação do nome para a suprema corte visando primordialmente o exercício do poder. O exercício do Direito, para o indicado, é apenas consequência do exercício do cargo (eu já tive oportunidade de estabelecer a diferença entre o exercício da administração e o exercício do poder num outro artigo nesta coluna).

 

E isto porque as decisões das cortes constitucionais em todos os países onde elas existem são, em sua essência, decisões pautadas na agenda política da sociedade (entenda-se: do governo), decisões que apenas reflexamente se louvam no Direito.

 

Ou alguém acha que havia no Brasil suporte jurídico positivado suficiente para definir as decisões do STF sobre aborto, pesquisas com células-tronco, casamento e direitos de pessoas do mesmo sexo? Nada disso ! As decisões do Tribunal nessas questões foram decisões políticas, vernizadas de jurídicas, ajaezadas pela pomposa máxima de que cabe ao Supremo a última palavra sobre a Constituição. Mas a Constituição não tratou desses temas. As decisões, portanto, foram essencialmente políticas. E nisto não há erro.

 

Hans Kelsen tratou desse tema numa série de ensaios publicados na década de mil novecentos e cinquenta, buscando responder à seguinte pergunta crucial da humanidade: O que é justiça?

 

Para o jus-filósofo alemão a questão é saber que parâmetros se deve tomar para aferir se um dado sistema político-jurídico é ou não é justo. A conclusão de Kelsen foi a de que é justo o sistema que contemple como fundamentais os valores eleitos pela sociedade como tais.

 

Assim, se num dado país elege-se a alteridade como valor fundamental da nação, o fato de alguém ser pilhado plagiando o trabalho acadêmico de outrem (mais recente acusação a Alexandre de Moraes) seria razão suficiente para retirá-lo da concorrência de um cargo público para cuja assunção exija-se reputação ilibada.

 

Mas esse não é o caso da sociedade representada por Michel Temer. Logo, a moral dessa sociedade contempla o plágio como conduta aceitável para um ministro da suprema corte. Isto até pode parecer ironia de minha parte, mas não é. É apenas a dicção da realidade.

 

Se assim não fosse, como justificar que num país cuja constituição alberga a separação dos poderes como princípio fundamental se aceite o veto do Judiciário à nomeação de um ministro pelo presidente da república, como ocorreu no caso de Dilma Rousseff na nomeação do ex-presidente Lula?

 

Neste sentido, a recente aprovação de Moreira Franco, sob a mesma acusação de desvio de finalidade que pesou sobre Lula, só confirma a regra: a moral da sociedade comandada por Michel Temer comporta além do plágio, a acepção de pessoas.

 

Quanto à acusação de que Alexandre de Moraes era filiado ao PSDB, nada demais. Nos Estados Unidos, autores da ideia de uma suprema corte, os juízes são conhecidos como “o juiz democrata fulano”, ou “o juiz republicano beltrano ”.

 

Porque decidem questões mais políticas do que jurídicas, não há nada de errado em que os juízes do Supremo tenham identificação ideológica com a direita, com o centro ou com a esquerda. Cada uma dessas vertentes tem seus ideais de justiça. E do debate interideológico da Corte resultam, quase sempre, sentenças equilibradas.

 

De modo que Temer escolheu bem o “seu” primeiro juiz.

 

O PT é que, na nomeação de oito, prestou um desserviço ao país. Tomado de um “republicanismo” ingênuo (ou terá sido asnice congênita?), não escolheu um sequer que se identifique com as ideias da esquerda.

 

Uma lástima.

 

* José Osmar Alves é Promotor de Justiça

José Osmar Alves*

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