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Quinta-feira, 25 de abril de 2024
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Deusval Lacerda

deusvallacerda@bol.com.br

18/08/2017 - 09h10

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Deusval Lacerda

deusvallacerda@bol.com.br

18/08/2017 - 09h10

Por que a corrupção no Brasil

São muitos fatores que levam um país ser considerado corrupto. E a contaminação do vírus da corrupção no tecido social só se impregna ao longo dos séculos, como ocorreu desde o começo da história do Brasil.

 

Para início de conversa, o descobridor do Brasil, Portugal, era um dos países mais atrasados cultural e economicamente na Europa, em 1500. O único ponto favorável era que havia atingido, quase por milagre, grande desenvolvimento e apogeu na navegação, que se iniciou com vistas à pescaria oceânica para a alimentação da sua população.

 

Ora, com esse histórico, o pequeno reino português não tinha as condições de colonizar organizadamente, como fazia Inglaterra com as suas possessões na América do Norte, uma área territorial tão extensa e longínqua com o Brasil.

 

E assim as coisas foram acontecendo aos trancos e barrancos. Passou logo alguns anos sem praticamente dar as caras por aqui, em razão dos custos da colonização. Como algumas expedições de outros países começaram a rondar o litoral brasileiro, as autoridades lusitanas passaram a se preocupar com a terra do pau-brasil.

 

Diante desse cenário, imagina-se das dificuldades da povoação brasileira. Com seus mistérios, problemas, carências, obstáculos, descasos, transtornos e desorganização para estabelecer as cartas régias apropriadas ao processo, quando geralmente era cada um por si e Deus por todos, uma vez que o centro das decisões não tinha como ser ágil e eficiente para dirimir as terríveis situações apresentadas.

 

Era, por vezes, uma terra sem lei (leis esparsas Afonsinas, Manuelinas), que escravizou os negros africanos aprisionados e comercializados – em Portugal não havia cativeiro – e dizimou os nativos (índios) em nome da exploração econômica para gerar riqueza para os colonizadores e butim de impostos para a Coroa de Portugal.

Na situação caótica Colonial, não foi assentada as molas mestras para a formação da identidade nacional, mas forjada no rescaldo do que poderia ser aproveitável na mixórdia dos colonizadores e a exploração predatória dos colonizados.

 

Os três séculos de colonização portuguesa foram de pouca valia para a formação brasileira tendo em vista transformar o Brasil em uma pujante Nação. Pois carecia de tudo, de um sistema educacional consistente, de uma institucionalidade condizente com o crescimento do que seria um País continental e de um amadurecimento político para uma nacionalidade voltada para o interesse da população em geral.

 

Pois, sabe-se, que, no amálgama da realeza e nobreza lusas em terras brasileiras era intrincado o interesse publico com o privado. Na metrópole, fazia-se o possível para coibir os vícios brotados no Brasil para a sonegação do que a coroa exigia. Na Colônia, fazia-se de tudo para burlar o que Lisboa queria. A derrama era uma das medidas drásticas dos reinóis.

 

E assim foi construindo o caráter público e privado dos que passaram a nascer, crescer, viver e reproduzir no Brasil-Colonial. Sempre sob a Espada de Dâmocles (Rei de Portugal) sedento de numerários, produtos e riquezas extraídos do solo e do subsolo (minerais) da Colônia. Os brasilianos faziam artimanhas ara driblar a apetência Real, e ainda sobrava a herança servil e escravocrata danosa para a moldura da identidade pátria.

 

Esse prolongado e nefando tempo se foram, e, como não poderia ser diferente, prorrompeu a Independência do Brasil em 1822. Este período era para ser decisivo na história brasileira, como ocorreu nos Estados Unidos da América que aproveitou a Independência para criar os postulados de uma nascente Pátria.

 

Mas não foi o que aconteceu. Aqui, o pai, D. João VI, embora para assumir o Trono de Portugal, que estava vazio por causa das guerras napoleônicas, e em terras brasilis deixou o Filho, D. Pedro I, para ser o imperador do Brasil. Ou seja, aqui ficaram os velhos defeitos portugueses piorados já quo o monarca tupiniquim era extremamente malvisto, inclusive taxado por certo historiador de “casca grossa em fruto fino”.

 

A nova nobreza brasileira não perdeu tempo, já pertencia ao status quo lusitano. E foi barganhando as riquezas nacionais com a Família Imperial, abocanhando terras, recursos naturais, postos de relevo e cargos públicos, ainda mantendo a ociosidade no trabalho escravo e no sistema cartorial e bajulatório.

 

Ficou, pois, no epicentro do Poder Imperial, acomodada no Conselho de Ministros de Estado, no Poder Legislativo (Assembleia Geral), no Poder Judiciário e nas Armas, sempre mancomunando o público com o privado.

 

A Proclamação da República ocorreu para, entre outros benefícios, conter a corrupção que reinava no Brasil, onde o fortalecimento das instituições, a representação política e a vigilância da sociedade ao poder público serviam de antídoto contra a corrupção.

 

Mas, na realidade, não foi isso o que se viu. Na República Velha, que vai de 1890 a 1930, a corrupção tomou conta dos governos e criou-se uma nova elite oligarca urbano-rural provinda dos produtores paulistas e mineiros que se revezavam no poder (apelidada de Café com Leite).

 

A Era Vargas, de 1930 a 1945, se dizia redentora e moralizadora do País. Também não conseguiu debelar a corrupção no poder. Os governos oligarcas de então, foram substituídos pela figura carismática de Getúlio Vargas. Nessa fase, com o crescimento da máquina administrativa, abriram-se espaços para as práticas clientelistas, patrimonialistas, nepotismo e desvio do dinheiro público. A corrupção deixou de ser inerente ao sistema politico para ser cada vez mais ato individual.

 

A mudança da capital do Rio de Janeiro para Brasília, em 1960, apesar de bem-intencionada, afirmam alguns especialistas e historiadores, facilitou ainda mais a corrupção no País. Pela distância dos centros urbanos e encravada no Planalto Central, Brasília se tornou uma corte corrupta e corruptora.

 

Com o Golpe Militar de 1964, a combinação regime de força com a capital isolada deu início aos escândalos financeiros, como os desmandos no extinto Instituto Brasileiro do Café (IBC), o perdão da dívida do Projeto JARI, a construção da ponte Rio-Niterói, o escândalo da financeira Coroa-Brastel, a grande fraude do caso da investidora Delfin com repercussão no extinto Banco Nacional de Habitação (BNH), a Transamazônica, os roubos na SUDENE, SUDAM e SUDECO, entre tantos outros.

 

Com a Nova República, em 1985, a corrupção não se arrefeceu, muito pelo contrário, atingiu o seu auge com o impeachment do presidente Fernando Collor de Mello. E também recrudesceu na era tucana, ou melhor, nos governos FHC, como nos casos da Pasta Rosa, SIDAM, Vale do Rio Doce, as privatizações etc.

 

Estourou também nesse tempo o caso Banestado, isto é, crime contra o Sistema Financeiro Nacional. Estimava-se que a lavagem de dinheiro mandava na época para o exterior algo na ordem de US$ 40 bilhões por ano. E que no mundo ela girava em torno de US$ 500 bilhões. O canal para a lavagem de dinheiro estava na famigerada CC5-Carta Circular nº 5, criada pelo Banco Central do Brasil (BC). Só no caso Banestado foram detectados mais US$ 30 bilhões remetidos para paraísos fiscais através da sua agência de Nova York.

 

Igualmente nesse ciclo, os economistas Marcos Gonçalves da Silva e Fernando da Silva, ambos da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), revelaram que o impacto da corrupção no desenvolvimento e no bem-estar social dos brasileiros era alarmante. Diziam ainda: “é mais cruel do que qualquer inflação, pois trabalha sempre a favor do atraso, drenando recursos para o desenvolvimento”. Segundo eles, custava ao País por ano, 1,8% do crescimento a menos e tornava a renda per capita a metade do que poderia ser.

 

Entretanto, há que registrar que a corrupção é o mais antigo crime praticado contra o povo brasileiro. A sua origem, como se pode ver, remonta à própria formação do País. Apenas para ilustrar, praticava-se a corrupção no Brasil-Colônia em plena luz solar. O militar português Luís Vahia Monteiro, que governou o Rio de Janeiro no início do século XVIII, escreveu ao Rei de Portugal dizendo que na província só existia ele de honesto. Pela sua luta contra a corrupção, morreu abandonado no Rio de Janeiro.

 

Face ao exposto, a corrupção no Brasil se tornou uma pandemia, proliferando em todos os setores da nossa organização social-institucional, principalmente depois que a direita brasileira, originária e herdeira desse saldo historiográfico nacional, desferiu o golpe parlamentar-constitucional-judicial contra a presidente legitimamente reeleita Dilma Rousseff, com o único intuito de representar a elite com a sua história e tradição, conforme o acima expendido.

 

*Deusval Lacerda de Moraes é Economista 

   

Deusval Lacerda*

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