Pra tentar explicar em parte o que é uma trilha sonora, estava eu muito cedo do dia, em uma fase dolorosa de minha vida, sem dinheiro do ônibus, caminhando em direção a casa de um amigo editor pra finalizar um trabalho. Lá ia eu nessa, até entrar em uma rua de lojas ainda fechadas e dar de cara com Still Loving You rolando no toca-som de um carro importado. Imediatamente o veneno fez efeito, comecei a me arrepiar, ao passo que me aproximava ia ficando mais intenso. Nos foleys, o som dos meus passos e as rápidas batidas do meu coração se misturavam e estavam em minhas orelhas internas cada vez mais alto. A música diz: Ainda te amo. Mas eu ouvia, PARE E SE AME!
Cerrei meu dentes mas já era tarde, os olhos já estavam muito marejados. A fragilidade de meu momento, o clima da manhã e a visão do que estava ao meu redor, era como a tridimensionalidade experimentada pelo expectador sentado em frente a qualquer uma das caixas mágicas que projetam essas histórias. Agora, após passar por aquela onda sonora, me sentia forte e o percurso havia se tornado menor.
Enfim... trilha sonora é isso. Uma simbiose antevista pelos desenhistas de som e que é nos dada como uma nave hermética que nos descola do mundo, atravessa as cenas e quando nos devolve a terra, precisamos enxugar uma lágrima no canto do olho para que o vizinho da cadeira ao lado não nos ache bobo por chorar assistindo a um filme.
Como disseram os mestres do veneno aos meus ouvidos: Pare e se ame!
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André Leão
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