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Segunda-feira, 20 de maio de 2024
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José Osmar

José Osmar

joseosmaralves@hotmail.com

16/06/2020 - 09h38

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José Osmar

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16/06/2020 - 09h38

IMPRESSÕES DE UMA VIAGEM A CUBA (CAPÍTULO VI)

Nunca havíamos comido uma costela de porco tão gostosa, assada na brasa, com baião de dois (arroz congrí), molho e salada.

Restaurante de beira de estrada tem o mesmo profissionalismo dos restaurantes de Havana.

 Restaurante de beira de estrada tem o mesmo profissionalismo dos restaurantes de Havana.

Na manhã seguinte partimos rumo ao norte do País. Nosso destino: Santa Clara, cidade de aproximadamente 220 mil habitantes, capital da Província de Villa Clara, localizada na região Central do País, a 260 quilômetros de Havana, conhecida como “a cidade de Chê Guevara”. 

De Santiago para Santa Clara são 630 quilômetros, percorridos em aproximadamente oito horas, com paradas para almoço e abastecimento do carro. A autoestrada (la carreteira central) tinha o asfalto em bom estado de conservação (abril de 2019), estava adequadamente sinalizada e em muitos trechos contava com três pistas de rolamento em cada sentido, separadas por canteiro central. Nessas condições, o trânsito era mais do que tranquilo, pois, como dito, faltam carros em Cuba.

Um bom serviço em todo o País

Por volta das 13 horas paramos para almoçar num restaurante à beira da estrada. As instalações eram simples, porém, tudo estava muito limpo, como sempre víramos até então em Cuba. A farda dos garçons, as toalhas, os lenços de pano e a disposição dos talheres nas mesas não deixavam dúvidas: estávamos num restaurante do Estado.

Sentamo-nos e imediatamente uma garçonete se aproximou, da mesma forma educada e gentil como noutros lugares onde estivéramos. Pedi uma cerveja. Quando a moça chegou, abriu-a delicadamente, verificou com um lenço se danificara a boca da garrafa, colocou a tampa sobre a mesa, pediu-me licença e pôs apenas uns dois dedos de cerveja em meu copo, deixando fazer espuma de propósito. Em seguida, pegou a tampa e nos perguntou sobre os nossos pedidos. Enquanto esperávamos o almoço, aproveitei para olhar o quadro de avisos ao lado do caixa. Ali estava a ficha sanitária do estabelecimento, que tinha passado por uma inspeção há aproximadamente três meses. Só para testar, falei alguma coisa em Inglês com a moça do caixa, que prontamente respondeu. Então, eu imediatamente voltei ao meu bom e seguro portunhol, com medo de passar vergonha na frente daquela figurinha tão miúda vivendo nos confins da Ilha de Cuba. O mesmo profissionalismo que tínhamos visto nos restaurantes de Havana agora testemunhávamos num restaurante de beira de estrada. Nunca havíamos comido uma costela de porco tão gostosa, assada na brasa, com baião de dois (arroz congrí – vide capítulo II), molho e salada. Yuri nos explicou que há uma preocupação muito grande do Governo no sentido de que os restaurantes tenham o mesmo padrão de serviço e de cozinha, nas grandes cidades como nos locais mais ermos do País. Os salários em Cuba são muito baixos e as gorjetas fazem a profissão de garçom ser muito valorizada.

O homem é o homem em qualquer lugar

A viagem seguiu tranquila, até que por volta das 15 horas precisamos reabastecer o carro. Abastecido, tentei pagar com cartão de crédito (havia uma placa a dizer que era aceito). Inseri o cartão na máquina e esperamos. Nada de sinal, apenas a indicação de busca. O frentista explicou que ali a internet era muito ruim. Depois de algum tempo, decidi pagar em dinheiro. Nosso motorista ficou desconfiado, achando que era malandragem do frentista. Ele sabe que, apesar do serviço de internet está iniciando em Cuba, o Governo sempre providencia sinal de boa qualidade nos estabelecimentos comerciais mais ligados ao turismo, para propiciar o uso do cartão de crédito. Acontece que os empregados desses estabelecimentos às vezes simulam dificuldade para passar o cartão, forçando o turista a pagar em dinheiro. Então, de algum modo, eles conseguem formar “sobras de caixa”.  Eu insisti num exemplo de como isso se daria, então o Yuri nos disse que eles podem abastecer os carros do Estado com menos combustível do que a cota diária, claro, em conluio com os motoristas. Assim, ao final do dia, eles têm “vendido” menos combustível do que o faturamento, daí a “sobra de caixa”. Como aparentemente o controle do consumo dos veículos é bastante rígido, parece óbvio que muita gente precisa participar da caixinha. Isso nos lembra alguma coisa no Brasil? Porém, é dever de justiça registrar que os sinais de corrupção em Cuba são escassos e muito discretos, e que de fato a internet é uma ferramenta ainda em implantação no País, o que dá ao nosso frentista uma boa chance de efetivamente ter falado a verdade. Evidentemente, ficamos chocados, mas é necessário entender que mesmo os comunistas precisam sobreviver.

Santa Clara

Por volta das 16 horas chegamos a Santa Clara. Hospedamo-nos num hostal no centro da cidade. Havíamos reservado e pago todos os hotéis ainda do Brasil. Era um estabelecimento privado. Eles, um casal, nos aguardavam, gentis e educados. Tudo estava muito limpo e organizado. Tinha um bom sinal de internet. Falamos com os nossos filhos no Brasil, comemos qualquer coisa, conversamos um pouco e dormimos como anjos…

P.S.: Parece que nalguns capítulos dessas impressões escrevi Iuri com “I” no início como sendo o nome do nosso motorista. Na verdade, o nome dele é Yuri com “Y”, em homenagem ao cosmonauta soviético Yuri Gagarin, o primeiro homem a ser lançado ao espaço, em 12 de abril de 1961, marcando o início da corrida espacial entre os a União Soviética e os Estados Unidos.

(Segue no próximo capítulo)

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