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Domingo, 19 de maio de 2024
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José Osmar

José Osmar

joseosmaralves@hotmail.com

10/03/2021 - 09h22

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José Osmar

joseosmaralves@hotmail.com

10/03/2021 - 09h22

POLÍTICA NÃO É UMA NUVEM

 

A palavra “política” tem origem grega e foi originalmente empregada para definir a atividade dos cidadãos que se ocupavam dos assuntos da polis, a cidade-estado, votando ou sendo votados. Assim, eram chamados de políticos tanto os eleitores quanto os candidatos. Votar e ser votado era uma obrigação dos cidadãos gregos.

Aristóteles dizia que a política é uma ciência cujo objetivo é a busca da felicidade humana. Para ele, a política não podia se afastar da moral, uma vez que a felicidade coletiva só pode ser alcançada por meio de um estado virtuoso, e este só é possível se os cidadãos que o compõem forem éticos.

A noção de política como uma ciência que contempla uma doutrina moral coletiva, embora muitas vezes negligenciada, sobreviveu até o início da idade moderna, quando filósofos e políticos em geral começaram a levantar dúvidas sobre os seus postulados morais, restando, por fim, chancelada a proposição de Machiavel segundo a qual em política os fins justificam os meios.

Nada obstante a consagração da proposição de Machiavel, a discussão sobre se a ética devia ou não fazer parte da atividade política prosseguiu por toda a alta Idade Média, embalada pelos exemplos da época nos quais não mais se vislumbravam quaisquer resquícios de ética no exercício da política, até que o diplomata alemão Otto von Bismarck (1815-1898) sintetizou todo aquele debate com a seguinte frase: “A política não é uma ciência exata, mas uma arte, a arte do possível”.

Bingo! De repente todos concordaram que a política realmente não era uma ciência que visava o bem comum. Não! A política era apenas um tipo de arte, a arte do possível e, como tal, tudo nela cabia, uma vez que efetivamente os fins justificam os meios, a depender apenas, claro, de uma boa justificativa.

No início dos anos mil e oitocentos a Coroa portuguesa aportou no Brasil com essa visão “moderna” de política. A partir de então, o “espetáculo político” nacional tem apresentado os mais variados tipos de malabarismos, todos admitidos de bom grado no grande circo, sob o generoso guarda-chuva do postulado bismarckiano da política como a arte do possível.

Caminhavam as coisas entre nós dentro da ‘normalidade’ de golpes e contragolpes sucessivos quando ali por volta de 1968 o banqueiro e político mineiro Magalhães Pinto (1909-1996) deu uma contribuição decisiva ao tema, ao “revelar”, como numa epifania, que política não era uma arte, como havíamos pensado com Bismarck; na verdade – disse ele - “a política é como nuvem: você olha, e ela está de um jeito; você olha de novo, e ela já mudou!”. 

Assim, além das malandragens que já eram praticadas no mundo político brasileiro, a partir da “descoberta” de Magalhães Pinto passou-se também a admitir que os políticos pudessem mudar de opinião e de lado a qualquer tempo, sem necessidade de maiores explicações, afinal, a culpa das mudanças não é dos políticos, mas da própria política que, como uma nuvem, muda ao sabor do vento.
 
Ao contrário dos tempos em que os políticos nasciam e morriam em suas posições ideológicas, mudar de posição, de partido e de ideologia agora passara a não ser mais um demérito, senão uma prova de competência política, afinal, “só não muda quem se demite do direito de pensar”, conforme lembrou o piauiense Petrônio Portela. De modo que a política, hoje, já não é apenas a arte do possível; ela é, especialmente, a arte do impossível, do impensável, do indescritível, do imponderável, do inominável. Não é nada agradável ver que homens como Machiavel, Bismarck, Magalhães Pinto e Petrônio Portela deram  – cada a um a seu tempo e por razões diversas - contribuição decisiva para a elevação do cinismo à potência máxima na política nacional.

Eu, porém, declaro o seguinte: Em Política, os fins não justificam os meios; Política não é ciência, nem arte, nem nuvem; Política é uma planície sem árvores, da qual a todo momento se pode ver o horizonte; ela é um instrumento por meio do qual os homens realizam pequenas e grandes obras coletivas, materiais e imateriais, tendo sempre como meta a realização do bem comum. A recompensa pelo trabalho imenso que a atividade política exige é unicamente o estipêndio que a lei designa para o cargo, além do gáudio pessoal de ser reconhecido pelas boas obras realizadas.

Ps: Ao morrer, o político e banqueiro Magalhães Pinto nos deixou dois legados terríveis: o cinismo escancarado na política e um prejuízo financeiro multibilionário*.  

*A enciclopédia eletrônica Wikipedia descreve o Banco Nacional da seguinte forma: “O Banco Nacional, originalmente Banco Nacional de Minas Gerais, foi uma instituição financeira brasileira fundada por Waldomiro de Magalhães Pinto e pelo ex-governador de Minas Gerais José de Magalhães Pinto. O Banco foi o principal patrocinador do piloto de Fórmula 1, Ayrton Senna, e foi também o primeiro patrocinador do Jornal Nacional, da Rede Globo. Nas partidas finais do Campeonato Brasileiro de 1984, patrocinou o Fluminense e o Vasco. Em 1994, o banco passou por dificuldades financeiras e sofreu intervenção do Banco Central do Brasil, que criou o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER) no intuito de evitar um desastre no sistema econômico do país. Em novembro de 1995, sob a acusação de ter inflado seu patrimônio com mais de 600 contas fictícias, o banco foi liquidado. A instituição recebeu aproximadamente R$ 15 bilhões do PROER. Pouco mais da metade desses recursos foram recuperados pelo Banco Central do Brasil. Seus ativos foram transferidos para o Unibanco e seus passivos ficaram com o Banco Central do Brasil (https://pt.wikipedia.org/wiki/Banco_Nacional).  

Conhecimento Científico

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