Facebook
  RSS
  Whatsapp
Segunda-feira, 06 de maio de 2024
Colunas /

Mauro Sampaio

Mauro Sampaio

mauroadrianosampaio@gmail.com

05/01/2022 - 19h48

Compartilhe

Mauro Sampaio

mauroadrianosampaio@gmail.com

05/01/2022 - 19h48

A casa grande do Olho d'Água dos Negros

 

A restauração da casa grande do senhor de escravos a 16 km de Esperantina (PI), na estrada que leva a São João do Arraial, é conquista da comunidade quilombola Olho d'Água dos Negros. Luta pela terra e suas colheitas. Luta pela existência digna. Luta pela identidade. Luta pelo pertencimento. Luta pela vida livre e destemida das novas gerações. 



Um certo Mariano Carvalho de Castelo Branco fundou a Fazenda Olho d'Água em 1847. Era tido como homem cruel. Jogava escravos punidos em um porão. Permitia abusos sexuais das negras cobiçadas pelos parentes e visitantes. A fazenda, rica da palmeira buriti - afinal, olho d'água - era engenho, era pecuária, era extrativismo vegetal, era agricultura de subsistência. Mas tudo pertencia ao senhor. A casa grande simbolizava autoridade e propriedade inquestionáveis. 




Em 1900, a fazenda foi transferida para a família Pires. A escravidão, sim, estava oficialmente abolida. Nesse novo contexto socioeconômico, olho d'água se tornou "dos Pires". Por mais de um século. As famílias descendentes de escravos que permaneceram na localidade tomaram consciência de que aquelas terras e seus frutos - e sua própria história de sofrimentos e humilhações - eram mais deles do que qualquer herdeiro branco. Iniciaram a luta pela propriedade a partir de 1980.



Em 2005, a Fundação Cultural Palmares concedeu certificado de Comunidade Quilombola. Em 2006, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Instituto de Terras do Piauí (Interpi) expediram a titularidade da propriedade. Desde então, chama-se Olho d'Água dos Negros. Sem moradores, a casa grande estava se desfazendo. Nova luta dos negros do olho d'água. A casa grande virou patrimônio e está restaurada e transformada em centro cultural, de memória e de vida da comunidade constituída por mais de 80 famílias. Ninguém será mais escravo de ninguém. Os buritis são testemunhas.



(crônica e imagens: Mauro Sampaio)
 

Comentários